Este texto tem como intuito relembrar o que é o […]

As conferências de SAN enquanto possibilidade para re-pensar e re-construir o SISAN

Escrito por Nathalia Figueiredo

em 15/09/2023 |

15

Este texto tem como intuito relembrar o que é o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), sua origem e desafios, mas também refletir sobre ajustes necessários e os próximos passos na reconstrução deste sistema de políticas públicas. Além disso, vamos contar sobre o novo chamamento da 6ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CNSAN), a ser realizada em dezembro de 2023 e claro, fazer um convite para a Conferência Nacional Livre de Alimentação nas Cidades – alimentação na cidade, comida de verdade. Vamos juntos?

O Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), sua história e componentes

Como contamos com detalhes em texto anterior do Comida do Amanhã, foi em 2006 que nasceu no Brasil um sistema multissetorial de construção e gestão de política pública, tanto no sentido horizontal, agregando diversos setores do governo federal e a participação da sociedade civil, quanto no sentido vertical, para alinhar as diversas competências constitucionais dos entes federativos no tocante à pauta da segurança alimentar e nutricional (SAN). Este sistema é o SISAN, instituído pela Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional – LOSAN, Lei nº 11.346, de 15 de Setembro de 2006 e composto pela Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional – CAISAN, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – CONSEA, a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – Conferência de SAN, além dos respectivos órgãos e entidades de segurança alimentar e nutricional dos estados, distrito federal e municípios.

O SISAN, apesar de ser considerado uma inovação quando se fala em política pública de SAN em âmbito global e de ter sido parte importante para o avanço das políticas alimentares e de SAN nos estados e municípios brasileiros, ainda pode ser considerado como um sistema novo e com necessidades de aprimoramento. Diferentemente do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Sistema Único de Assistência Social (Suas), o SISAN desde sua criação até o momento possui adesão voluntária por parte dos estados e municípios, não estipula um órgão gestor claro e definido nos estados e municípios como destinatário dos recursos, não define recurso / orçamento obrigatório da União para os demais entes da federação, além de apresentar ainda divergências técnicas sobre o próprio conceito de políticas públicas de SAN.

Também vale mencionar, que em 2019, a Medida Provisória 870, de 01 de Janeiro de 2019, que redesenhou a administração pública federal naquele ano – posteriormente convertida na Lei Federal nº 13.884 – extinguiu o CONSEA e rapidamente promoveu a desarticulação da CAISAN e dos entes estaduais e municipais o que acabou por minar o próprio SISAN, deixando-o esvaziado de sentido nos anos que se seguiram. Mesmo neste momento, quando o SISAN foi interrompido, consideramos que ele ainda estava em um processo de construção, de ajustes e alinhamentos. Em 2023, com o início do atual governo federal em janeiro de 2023 e o novo organograma da Esplanada dos Ministérios, definido pela Medida Provisória nº 1.154, de 1º de Janeiro de 2023, que dentre outras medidas revogou a Medida Provisória de 2019, a LOSAN voltou a ter seu texto original, com a previsão da existência do CONSEA. E é exatamente agora que devemos refletir e agir sobre o SISAN, levantando e respondendo perguntas como: para o que serve o SISAN? o que de fato gostaríamos de construir a partir deste sistema? Qual é a agenda e o papel do governo federal e dos estaduais e municipais?

Retomada do SISAN e a criação de novas possibilidades

O Brasil vive atualmente um momento oportuno para o redesenho do SISAN, especialmente a partir do processo das Conferências de SAN que vem ocorrendo em todos os níveis de governo. É neste contexto que surge a oportunidade de avançarmos na pauta, apontando críticas, mas também proposições mais atualizadas ao SISAN. Na realidade, a realização das conferências em âmbito municipal e estadual se iniciam a partir da convocação do CONSEA para a 6ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CNSAN), que será realizada de 11 a 14 de dezembro, em Brasília.

Dentre elementos relevantes para a construção de um SISAN mais robusto, eficiente e moderno vale ressaltar que Eixo 2 da CNSAN de 2023 discute exatamente este tema: Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e Políticas Públicas Garantidoras do Direito Humano à Alimentação Adequada. Este eixo temático busca elaborar um diagnóstico da implementação do SISAN, propor diretrizes e prioridades para o 3º Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional; promover compromisso dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário nas três esferas federativas para o fortalecimento e democratização do Sisan; e definir estratégias para formação permanente de gestores, trabalhadoras e trabalhadores e de integrantes do controle social em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional – SSAN e sobre o DHAA em processos dialógicos e participativos.

Além disso, neste ano, o processo de realização das conferências possui uma nova modalidade de atividade, as conferências livres nacionais. Estas surgem enquanto atividades autogestionadas, de caráter deliberativo, com o intuito de ampliar a participação social nos debates, formulação de propostas e para a eleição de delegados(as) da sociedade civil para estarem representados na Conferência Nacional. O Comida do Amanhã não poderia deixar de fazer parte deste processo e, por isso, está organizando em parceria com diversas instituições a Conferência Livre Nacional – Alimentação nas Cidades – alimentos na cidades, comida de verdade. Esta conferência é convocada e coordenada pelas seguintes organizações: Instituto Comida do Amanhã; Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição (OPSAN/UnB); Escola de Nutrição da UNIRIO; Grupo de Estudos e Pesquisas em Agricultura, Alimentação e Desenvolvimento da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (GEPAD/UFRGS); Grupo de Estudos, Pesquisas e Práticas em Ambiente Alimentar e Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais (GEPPAAS/UFMG); ICLEI América do Sul; Instituto Regenera; Centro de Estudos da Metrópole (CEM/USP) e CEFET/MG, com o apoio do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome. Trata-se de uma atividade de abrangência nacional que irá compor a etapa preparatória da CNSAN e ocorrerá de maneira remota no dia 4 de outubro de 2023 no horário de 09:00 às 18:00hrs. Você está convidado a participar desta atividade e colaborar na construção de um novo SISAN.

O que queremos do SISAN?

Acreditamos em todo o potencial de impacto positivo que o SISAN pode ter no avanço das políticas alimentares e na redução da fome e insegurança alimentar no Brasil. Por isso, seguimos trabalhando pela (re)construção coletiva deste sistema. O Comida do Amanhã advoga para que o SISAN se torne um sistema obrigatório, com recursos definidos e transferências orçamentárias garantidas, com atuação intersetorial e definição clara das competências de cada nível de governo da federação, e portanto com uma agenda coordenada entre estados e municípios, e com a definição de um órgão gestor para a agenda alimentar em cada ente. O SISAN há de ser baseado no princípio da promoção universal da segurança alimentar e nutricional, ainda que com priorização do combate à insegurança alimentar a partir do financiamento e desenvolvimento de equipamentos de SAN de qualidade, centros de referência e treinamentos frequentes para as equipes técnicas. É preciso ainda reconhecer o papel central das desigualdades sociais e concentração de renda no agravamento da insegurança alimentar, e atuar para orientar as políticas alimentares à promoção da justiça social e equidade.

Vamos trabalhar juntos nesta construção?

Obs: Este ano, foi lançado um documento com um passo a passo de como os municípios podem aderir ao SISAN. Confira aqui o documento.

Para saber mais

Continue se informando com outros artigos relacionados

  • A perspectiva feminista dos sistemas alimentares nas cidades no 52º Comitê de Segurança Alimentar Mundial (CFS 52)

  • Relatório do SOFI 2024: novos desafios e alternativas para a superação da fome até 2030

  • Position paper – Agrifood Systems Monotony And The Opportunities Arising FromThe Global Alliance Against Hunger And Poverty And The Global Mobilization Against Climate Change

  • Destaques da semana: entrega das recomendações do C20 sobre segurança alimentar, lançamento da edição de 2024 do SOFI e pré-lançamento da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza

  • Maior laboratório de políticas públicas alimentares do mundo está com inscrições abertas até 31 de julho

  • Em relatório do Painel de Alto Nível de Especialistas em Segurança Alimentar e Nutricional (HLPE – FSN) lançado nesta terça-feira, 02, o Laboratório Urbano de Políticas Públicas Alimentares (LUPPA) recebeu um destaque como rede nacional de cidades. O HLPE é um órgão auxiliar nos trabalhos do Comitê de Segurança Alimentar Mundial da ONU que todo ano se debruça sobre um tema e lança um relatório de análises técnicas e recomendações de política pública. Este ano, seguindo os passos do relatório “Estado da Segurança Alimentar e a Nutrição no Mundo” (SOFI) de 2023, o tema eleito foi o dos sistemas alimentares urbanos e periurbanos e o contexto da crescente urbanização mundial, com o objetivo de alcançar a segurança alimentar e nutricional das populações que vivem nestas áreas. Apresentando uma análise profunda dos desafios e oportunidades, e mostrando como as zonas periféricas têm um impacto importante nos sistemas alimentares, influenciando a produção, a distribuição e os padrões de consumo a nível mundial. Além disso, o relatório também destaca a importância de uma governança em vários níveis, multilateral, com diversos atores e a relevância das redes de cidades dão apoio para os municípios avançarem na gestão dos sistemas alimentares, trazendo como exemplo o LUPPA. O LUPPA é o maior laboratório de políticas públicas alimentares do mundo, um programa do Instituto Comida do Amanhã em correalização com o ICLEI Brasil, com o objetivo de facilitar a construção de políticas alimentares municipais integradas, participativas e com abordagem sistêmica. Para Juliana Tângari, diretora do Comida do Amanhã e coordenadora do LUPPA, esse destaque reconhece a relevância do trabalho que o LUPPA está realizando no Brasil. “Assim como o IPES-Food em 2023, o HLPE reconhece a relevância das redes de apoio às cidades, especialmente das redes de cidade de âmbito nacional, e tal como o IPES-Food, cita o LUPPA como exemplo de mecanismo de apoio e facilitação para as cidades. Mais uma vez o LUPPA é inserido num rol de poucos exemplos mundiais, sendo o único do Sul Global, indicando a relevância do trabalho que estamos fazendo por aqui”, destacou. Este relatório é uma ferramenta importante para formuladores de políticas públicas, pesquisadores e partes interessadas dedicadas a garantir a segurança alimentar e nutricional no contexto da rápida urbanização. Acesse o relatório completo em: https://www.fao.org/cfs/cfs-hlpe/publications/hlpe-19. Sobre o LUPPA O LUPPA é um programa do Instituto Comida do Amanhã em correalização com o ICLEI Brasil, com o apoio pleno do Instituto Ibirapitanga, do ICS – Instituto Clima e Sociedade e da Fundação José Luiz Egydio Setúbal e da Porticus, apoio institucional da FAO Brasil – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura e parceria metodológica da Reos Partners.

  • LUPPA é destaque como rede nacional de cidades em relatório do Painel de Alto Nível de Especialistas em Segurança Alimentar e Nutricional (HLPE – FSN) sobre sistemas alimentares urbanos e periurbanos

  • Agroecologia urbana e sistemas alimentares circulares: A peleja de uma política em construção contra o dragão da fome no Brasil

  • Evento “Estratégias para o fortalecimento de alimentação saudável nas cidades”, focado na segurança alimentar urbana, acontece no dia 6 e 7 de junho, no Rio de Janeiro

  • Eleições Municipais e Sistemas Alimentares No Centro da Agenda Municipal